Este artigo traz uma primeira amostra da pesquisa em desenvolvimento sobre a situação atual e histórica (2005-2022) da participação das mulheres em diferentes áreas do conhecimento, a partir do banco do Painel de Fomento em Ciência, Tecnologia e Inovação do CNPq, lançado em setembro de 2023. A partir dos levantamentos já realizados, apresentamos um recorte do perfil interseccional de pesquisadoras e pesquisadores seniores do país no ano de 2022, onde buscamos analisar a distribuição das bolsas de produtividade em seis áreas disciplinares dentro das chamadas ciências humanas. A escolha dessas áreas das ciências humanas para essa primeira amostra é justificada tanto pelo fato de que, usualmente, se considera tais áreas como as com maiores participações de mulheres, como para melhor nos conhecermos, tendo em vista que é justamente nas humanidades que se concentra a grande maioria dos núcleos de gênero que integram do Observatório Sul-Sudeste do INCT Caleidoscópio. Um objetivo central da amostra, além de divulgar essa nova ferramenta de pesquisa disponibilizada pelo CNPq, é já divulgar a possibilidade de explorar de diversas maneiras os dados obtidos pelo Painel. Nesse caso exemplificamos algumas relações possíveis de serem analisadas a partir do ‘perfil interseccional’ das/os bolsistas na modalidade de produtividade em pesquisa. Disponibilizamos também a possibilidade de uso do software de Análise Interseccional de Perfil – AIP(Feltrin, 2021) adaptado para as análises empreendidas no âmbito do Observatório Sul-Sudeste, uma inovação para operacionalizar a análise de perfil de forma interseccional. Este tipo de análise busca captar a complexidade do universo analisado, não se limitando a questões como “quantas mulheres recebem bolsa de produtividade”, mas estendendo o debate para “quais mulheres recebem bolsa produtividade”, já que elas não formam um grupo homogêneo e os diferentes marcadores sociais que as atravessam influenciam na sua entrada, permanência e ascensão na carreira acadêmica.
Inúmeras pesquisas já apontaram que as mulheres enfrentam dificuldades extras para ascender na carreira acadêmica (Lima, 2008; Lopes & Costa,2005),não relacionadas ao domínio cognitivo ou à competência, mas a preconceitos socioculturais de gênero e/ou outros marcadores sociais da diferença associados. Tais barreiras nos indicam que o mundo da ciência está longe de ser neutro e imparcial (Velho & Prochazka, 2013), reforçando os mesmos preconceitos da sociedade em que está inserido. Neste contexto, a análise do perfil interseccional das bolsistas produtividade do CNPq poderá fornecer indícios valiosos sobre ascensão das mulheres na carreira científica no país, uma vez que o CNPq é um dos principais órgãos de fomento à pesquisa no Brasil e a única agência nacional a conceder bolsa de produtividade aos pesquisadores/as, a qual pode ser considerada um importante indicador de senioridade na carreira acadêmica.