Quantas professoras quilombolas concursadas, como docentes efetivas, em universidades públicas conhecemos? Como acessamos essas informações? Quantas pesquisadoras quilombolas, em diferentes estágios da carreira científica, estão presentes nas universidades públicas? Como localizar as teses e dissertações escritas por mulheres quilombolas? Estas não são perguntas de fácil resposta como deveriam sê-lo, pois os dados sobre mulheres quilombolas nas ciências se encontram pulverizados e pouco sistematizados em decorrência das limitações nas informações disponibilizadas sobre pertencimento étnico-racial, especificamente sobre quilombolas, na pós-graduação brasileira.
No entanto, apesar das limitações de acesso a informações sobre suas produções e trajetórias acadêmicas, mulheres quilombolas estão presentes em diferentes programas de pós-graduação, algumas são docentes em universidades e acumulam uma expressiva produção na orientação de dissertações e teses, ainda com acesso público limitado, muitas vezes em bases de dados agrupadas a partir de outros marcadores acadêmicos e sociais. A dificuldade de acesso a dados sistematizados sobre a presença de mulheres quilombolas nas ciências contribui para uma experiência de despertencimento à universidade para mulheres racializadas e sub-representadas nas ciências.
A baixa diversificação étnico-racial dos quadros docentes e de pesquisadoras nas ciências brasileiras, incluindo as mulheres quilombolas, reafirma a intersecção entre raça, gênero e territorialidade como um obstáculo epistêmico e político que atravessa a trajetória de mulheres nas ciências, no Brasil. (Carneiro, 2005; Gonzalez 1984).
No contexto da educação superior, a distribuição de vagas reservadas para quilombolas nas universidades públicas revela desigualdades significativas entre as regiões brasileiras. Segundo Freitas et al. (2021, p. 32), a região Norte, incluída na Amazônia Legal, apresenta a maior proporção de vagas destinadas aos quilombolas, representando 1,67% do total de vagas disponíveis. A região Centro-Oeste vem logo em seguida, com 1,48% de vagas reservadas. Por outro lado, as universidades públicas da região Sudeste não possuíam vagas reservadas para quilombolas, e na região Sul as reservas eram ínfimas. Ao considerar a análise proporcional, de acordo com Freitas et al. (2021), observa-se que as vagas destinadas a quilombolas no Nordeste representam apenas 0,58% do total de vagas existentes na região.
Apesar do impulso à implementação de ações afirmativas no ensino superior, sobretudo, após 2003, com a efetivação do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) e a Lei 12.711, aprovada em 2012, apenas 0,52% do corpo discente das universidades federais brasileiras é composto por estudantes quilombolas (Freitas, Portela, Feres, Sá, Flor, 2020). De acordo com levantamento realizado pelo Grupo de Estudos Multidisciplinares de Ação Afirmativa (Gemaa), em 2021, das 106 universidades públicas brasileiras, apenas 20% ofertam cotas para ingresso de quilombolas, concentradas em oito estados: Bahia, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Pará, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Tocantins.
São raras as pesquisas sobre acesso, permanência e progressão nas carreiras científicas de mulheres quilombolas nas universidades, bem como são igualmente escassas as pesquisas sobre formação de doutoras quilombolas e fixação das egressas dos programas de pós-graduação. As fontes de informação são frágeis, uma vez que, nem todas as instituições de ensino superior incluem o campo “quilombolas” nos documentos internos destinados ao corpo discente, utilizando as categorias étnico-raciais vigentes no IBGE até o Censo Demográfico de 2010 que não contemplavam quilombolas, correspondendo a negras, indígenas, amarelas e brancas. A partir do Censo Demográfico de 2022, as categorias étnico-raciais passaram a contemplar quilombolas ao lado das pessoas negras, indígenas, asiáticas e brancas.
Considerando este cenário, o artigo tem como objetivo apresentar resultados preliminares do primeiro ano de funcionamento da Incubadora Norte-Nordeste e Amazônia Legal, abrangendo dois eixos. Um primeiro eixo, que apresenta o modo de organização e estratégias desenvolvidas com vistas à sua difusão e adoção em outros contextos universitários. Um segundo eixo que, por sua vez, consiste numa análise preliminar das entrevistas realizadas com mulheres quilombolas nas ciências como parte das ações da incubadora.